Ingredientes de Insanidade
Esses dias vi o cônsul chinês do Rio de Janeiro dizer que, ao contrário dos EUA, a China não quer causar problemas ao mundo. Eu sei que, do ponto de vista deles, talvez não queiram, assim como os EUA também não querem. Mas, para não “causar problemas” é necessário ordem e quando se pensa em um mundo com 7 bilhões de pessoas, regiões prósperas, outras decadentes, é impossível não pensar que esta ordem necessite, em algum momento, de imposição e repressão ao que pode se tornar o caos, a violência e a barbárie.
Mesmo entre as pessoas que não simpatizam com Bolsonaro, tenho visto um crescente repúdio, quando não ódio explícito, à China e quando se fala em “China”, a maior parte das pessoas não faz um mínimo esforço para diferenciar governo, estado, partido de pessoas, províncias, regiões. Para eles, simplesmente, convém colocar tudo no mesmo caldo e mexer até sair o sumo da imbecilidade temperado com o preconceito, a xenofobia e racismo. É difícil, mas como sabemos, não é nenhuma novidade que assim seja, afinal, é muito mais fácil colocar uma culpa por não se ter mais sua vidinha de volta em alguém ou algo que representa o desconhecido, grande, poderoso e lugar de seus mais recônditos medos.
O medo não é um equívoco, é um mecanismo de defesa, mas o medo como política é uma arma, recorrentemente utilizada. E é aí que entram fanáticos, fundamentalistas e opostunistas. É o medo que leva uma mulher, leitora de autores liberais, supostamente equilibrada emocionalmente, a chamar chineses de “gafanhotos” por construírem ilhas artificiais no mar ao sul, próximo da Malásia em área disputada por vários países. O mesmo nojo expresso pela dona não foi nem sequer cogitado quando americanos espalham seus enormes porta-aviões classe Nimitz pelos oceanos. Não, daí são paladinos que nos mantêm seguros. Aí, o medo age com firmeza.
Outro dia li um autor, liberal, de um famoso site, dizendo que o vírus era causado pelo Partido Comunista Chinês. É fato que o partido escondeu o surgimento da nova epidemia, censurou e, provavelmente, prendeu jornalistas e médicos, mas considerei à época que não seria possível conter a transmissão mesmo avisando com antecedência, o que fica claro hoje, embora não exima o Partido Comunista de sua grande culpa. Mas outro fato igualmente é que a culpa não é só dele, mesmo porque o nível de negação, seja minimizando o risco de transmissão ou impacto no sistema de saúde e mortalidade direta e indireta, assim como das medidas protetivas corretas, é compartilhado por muitos, inclusive por aqueles que ainda crêem no tratamento precoce. Aí, o fanatismo age com desenvoltura.
Ainda temos aqueles autores e fomentadores do movimento liberal que acham que a hidroxicloroquina é uma boa opção porque não impede a recessão econômica. Quando provado sua ineficácia, mesmo sabendo da possibilidade de um grande número de vidas perdidas, o autor do artigo da Folha de São Paulo não foi digno o suficiente para se retratar ou tecer alguma consideração. Não, nada, apenas o silêncio quebrado por uma melodia fúnebre de quem acha que tanto faz ser Let it Be ou Let it Bleed. O que importa, sempre importou, foi nada mais nada menos que a economia, como se esta prescindisse de peças da engrenagem chamadas “humanos”. Aí, o fundamentalismo fala alto e fala mais alto quando um candidato à vereador diz que a vacina obrigatória não tem base científica, afinal é tudo uma questão de “controle”. E pouco lhe importa para que serve este controle.
Me pergunto como nos comportaríamos numa guerra com estes pares liberais, já que os socialistas se contentariam com uma direção governamental e planejamento central. Ambos polos deste espectro ideológico não percebem que o indivíduo é fundamental para o desenvolvimento e sustentabilidade das sociedades, mas desde que aja no sentido correto, o sentido em que várias pessoas se unem, por vontade própria.
Aos medrosos e covardes, sempre haverá um buraco para se esconderem e guardarem suas bugigangas compradas na polishop. Não, não queremos tomar isto de vocês.
Aos fanáticos, sempre haverá um opostunista que mandará vocês comerem estrume pensando que é feijão tropeiro, vocês são úteis como peões para incursões suicidas ou rezes rumando ao abate.
Aos fundamentalistas, vocês sempre terão espelhos e grupinhos em suas igrejinhas ideológicas que chamam de think tanks com pirralhos de gravatinha borboleta e piranhas com sandálias caras para elogiarem tua inteligência padronizada e insípida.
Não deixa de ser uma bela imagem… Eu os vejo como ratos se equilibrando em um tronco que desce um rio rapidamente rumo à cascata, enquanto que pensam que estão guiando e no comando.
Tolos.
Anselmo Heidrich
6 mar. 21